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A impressão que UM brasileiro pode causar

  • Foto do escritor: Paula Pereira
    Paula Pereira
  • 29 de jul. de 2021
  • 5 min de leitura

Atualizado: 29 de jan. de 2022

Estou lá sentada no banco de uma praça super arborizada, bem no centro de Odessa. Tarde linda e calorosa terminando de tomar meu frappuccino. Estou acompanhada da minha professora de russo e de Letícia, minha amiga brasileira. Estamos aguardando a chega de outros dois brasileiros que estão turistando pela cidade. Não os conhecíamos, aquele era um primeiro encontro agendado pelo Facebook. Sabe como é: basta ser brasileiro para a gente sentir que "tem tudo a ver". Porém, eis que chega a dupla de amigos: ela, uma mulher simpática e ele, um brasileiro que me fez sentir vergonha de simplesmente andar ao lado dele. Ao final do encontro me senti na obrigação de dizer à minha professora de russo: "Lamento que tenha conecido esse cara. Ele representa o que eu mais destesto neste "tipo de homem"... brasileiro*".


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Que cara era aquele?

Um fanfarrão metido a besta que a cada conversa só me fazia ter mais certeza do quanto eu prefiria nunca tê-lo conhecido... e nunca tê-lo apresentado à Lisa, minha professora de russo que pela primeira vez conhecia um espécime "homem brasileiro". De shortinho colorido, com seu andar carioca, ele chegou com sua garrafa de cerveja batizada com "sei lá o quê". Veio já levemente "alterado", narrando seu passeio pela Ucrânia como se aqui fosse um grande parque temático para adultos degenerados: muita festa, muita bebida, mulher gostosa, muitas drogas e curtição. Pelo visto, ele já havia feito de tudo: de rave a coquetel de drogas, ele não tinha escrúpulo algum, muito pelo contrário, ele ainda se achava "o tal".


Tendo nascido e sido criado no Brasil, ele fixou residência na Suécia - país de origem de seu pai - e segundo ele, os últimos seis anos de sua vida tem sido pura curtição; ele passou viajando, conhecendo países, mulheres e caindo na farra esse tempo todo. "Trabalho" para sustenter tudo isso? O que é isso?". Era muito exibicionismo para um cara só e eu queria ver se ele seria capaz de "falar sério". Tentei, diversas vezes, fazer alguma pergunta que exigisse um raciocínio, uma avaliação da vida, um apreço pelas "incríveis" oportunidades que ele tem de poder viajar o mundo e estar em contato com tantas outras culturas. Afinal, viajar, conhecer tantos países, tantas pessoas, deve fazer você "ter uma noção de mundo diferente, não?". Mas tudo o que obtive como resposta mostrava que, além da descompromissada vida rica, não havia mais nada. Ele era um escroto.


Este tempo todo, com Lisa (a professora de russo) ao meu lado, eu preferiria que aquele anta não falasse inglês, para poder poupá-la dos comentários que ele fazia. Saímos para caminhar em direção ao mar negro para apresentar algumas das atrações que existem pelo caminho: música ao ar livre, artistas vendendo pinturas, tours em carrinhos elétricos, museus... nada disso fazia o toscão prender seu olhar. O tempo todo ele queria é nos convencer a ir a uma praia nudista que existe por aqui, encher a cara, marcar de ir à boate à noite e, quem sabe até, comprar drogas "com uns caras que ele conheceu por aí". Há poucos dias ele estava em Odessa, mas já havia passado um mês em Kiev- onde, pelo visto, realizou todas suas fúteis fantasias.


Praça em Odessa
Praça próximo à Prefeitura de Odessa

Andávamos pela calçada, passando em frente aos lindos restaurantes e cafés próximos à Prefeitura, tentando manter um diálogo pelo "tempo mínimo necessário" para concluir aquele encontro. Existia nós e existia ELE. E ele estava lá, bebendo sua quinta ou décima cerveja, falando super alto... mais alto do que a música que ele resolveu deixar tocando no celular, como se fosse uma caixa de som para Odessa inteira ouvir. Eu estava envergonhada. Meu pai diria "Me diga com quem andas e te direi quem és..." - eu queria ZERO ligação com o canalha.


Numa tentativa de iniciar um assunto sério, perguntei a ele como tem sido sua experiência de viajar a tantos países em plena pandemia:


- Você deve ter feito muito teste PCR então.. já que viaja tanto - comentei.

- Teste PCR? Que nada!

- Como assim? Você não tem que fazer teste PCR quando viaja para outros países?

- Tudo falso. Eu faço meu próprio teste PCR (risos) - e nessa hora, eu sem saber como interpretar, continuei a indagar:

- Como assim você faz seu próprio teste PCR? - "Será que eu ando tão por fora do assunto que hoje em dia já existe alguma tecnologia que permita as pessoas apresentarem um autoexame no aeroporto?", pensei comigo.

- Não, é Photoshop mesmo. Eu só alterado a data do exame negativo que eu já tinha. Ninguém nunca conferiu.



Pronto. Alguém explode esse cara no espaço, pelo amor de Deus!!! Eu não podia acreditar no que estava ouvindo. Ele tem a audácia de falsificar o exame PCR? Ele "achar" que não tem nada, é uma coisa, mas se negar a fazer o exame quando vai viajar durante horas num avião com outras pessoas, falsificar o exame repetidamente, se vangloriar do ato e ainda sair ileso disso? Não consigo crer que no que estou ouvindo, é muito mau caratismo e muita falta de justiça no mundo.


Eu não tinha mais onde enfiar a cara e já não sabia mais como levar qualquer conversa adiante com aquele ridículo. Minha amiga Letícia, também visivelmente desconfortável com a conversa e atitude do cara, também preferiu encerrar o encontro e fizemos isso de forma bastante educada - e não da forma como aquele cara realmente merecia. Voltamos pra casa perplexas.


A impressão que UM brasileiro pode causar

O Brasil desperta boas reações nos ucranianos, não me canso de dizer isso. Seja por causa das praias, do futebol ou do carnaval, os ucranianos dificilmente vão ter uma reação negativa quando ouvem você dizer "Sou do Brasil" - pelo menos esta é a experiência que tenho tido. A maioria deles, é claro, só conhece o Brasil que aparece na televisão e na internet, mas desconhecem os "brasileiros" - "Quem são eles? Será que são mesmo tão simpáticos, calorosos e acolhedores?" - Só conhecendo pra saber, certo? E é por isso que carrego comigo um senso de "responsabilidade" sobre a nacionalidade que represento, pois talvez ao me conhecer, algum ucraniano use essa experiência para "definir, confirmar ou negar" suas ideias e impressões sobre quem são os "brasileiros".


Esse rapaz "brasileiro" que conhecemos aqui em Odessa foi o pior espécime do Brasil que eu já conheci nos últimos anos. De certa forma, com seu jeito festeiro, simpático e extrovertido, ele representava sim um pouco desta "fama" dos brasileiros; mas todo o restante dele... era demais e simplesmente inaceitável.


* Claro, ele é apenas um indivíduo e, brasileiro ou não, a atitude de um homem assim seria desprezível (por mim) em qualquer lugar. Mas vindo do meu país de origem, gostaria de ver mais pessoas "do bem" causando boas impressões mundo a fora.

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