Plano de saúde para alguém brincar com a sua
- Paula Pereira

- 27 de ago. de 2019
- 4 min de leitura
Atualizado: 8 de fev. de 2022
“Plano de saúde pra quê?”. Nunca consegui responder direito essa pergunta ao meu marido que é de um país onde as consultas são agendadas praticamente de um dia para o outro. Sempre que respondo, digo o que “acho” que é verdade: “Plano de saúde pra quê? Para conseguir marcar consulta mais rápido, para ser atendida na emergência sem esperar deitada em uma maca velha no corredor e para não ter que, de repente, pagar por uma cirurgia com meu próprio olho, meu próprio rim ou com minha arcada dentária”.
A pergunta é simples, mas a resposta bem mais complexa. Aguardar quase dois meses por uma consulta não é bem o que eu chamaria de “atendimento rápido”. Sem contar que alguns consultórios fazem questão de abrir a agenda somente na primeira semana ou no primeiro dia … do mês “seguinte” ao telefonema.
É 10 de agosto e você quer marcar um gastroenterologista? Ligue no mês que vem, a agenda para setembro já fechou. Está perdendo peso repentinamente? Segure as pontas até outubro, se estiver com vômito ou diarreia forte, vá ao Pronto Atendimento.
Só que nem sempre um corpo doente responde com dor, febre, vômito ou diarreia. E aí, como resolver? Imagina, você encontra um caroço na barriga e faz o quê? Reza pro anjo te guardar até o dia da consulta? Ou pede para ele te abençoar com um pouco mais de dinheiro naquele mês para que você possa agendar uma consulta particular que custa trezentos reais?
Eu queria poder dizer que com o plano de saúde o atendimento é mais “humano”: que os médicos vão se importar mais em resolver seu problema; que as secretárias vão te ligar, até você atender, só para informar que foi preciso cancelar a consulta; que na clínica as mocinhas vão te passar as informações corretas; que no pronto atendimento eles vão se lembrar que você existe na sala do sorinho e que, no hospital, o prontuário falará a verdade e que o botão de emergência vai funcionar. Mas não há garantias e os problemas são mais frequente do que eu esperava.
Semanas atrás, por exemplo, vivi dois episódios dignos de novela mexicana: um com meu Plano de Saúde e outro com uma clínica de fisioterapia.
Caso de incompetência 1: autorizaram o exame errado.
Devido à minha insistência em remarcar consultas com meu gastroenterologista, ele se viu obrigado a definir melhor meu problema e, por isso, solicitou um exame chamado “defecograma”. Eu gostaria de poder dizer ao meu marido que, por causa do meu “ótimo” Plano de Saúde, bastaria fazer uma ligação para agendar o exame. Mas aí começaram os poréns da história. O exame que eu tinha que fazer precisava ser autorizado pela auditoria. Prazo informado: 5 dias úteis. Prazo real: o dobro. Eventualmente o exame foi autorizado. Ufa! Só faltava agendar o exame.
O exame seria feito em Campinas. Liguei na clínica e passei todas as informações que constavam na Guia do plano de saúde. Conversa vai, conversa vem e eu reparando no termo que aparecia no papel “videodeglutograma”. Eis que, como se lendo meu pensamento, a recepcionista me pergunta:
“Seu problema é de deglutição, não é?”
“Não, é de constipação”.
E não podia ter sido pior, o plano de saúde demorou esse tempo todo e ainda autorizou o exame errado. E o que aconteceu em seguida? Voltei pra lista de espera da auditoria. “Duas semanas” mais tarde, o exame “certo” foi autorizado.
Caso de incompetência 2: consulta do buraco errado.
A outra situação foi mais “cômica” ainda. O gastroenterologista disse que meu problema de constipação crônica talvez pudesse ser resolvido com terapia de biofeedback; que eu precisava “reaprender a fazer cocô”- termo usado por ele, não por mim.
De novo aquele processo: primeiro aguarda a auditoria, depois aguarda para agendar uma consulta com a fisioterapeuta; aí aguarda mais um pouquinho. Nisso, um mês se passou.
Chego à clínica, desta vez em Jundiaí, e me parece que, desta vez, o atendimento vai ser digno de quem paga plano de saúde. Atendentes simpáticas e clínica limpinha. A fisioterapeuta me chama no consultório e a caminho da sala reclama de dores no corpo, rindo da situação. Digo a ela que, o que talvez cure sua dor nas pernas, nas costas e na cabeça, seja um bom mês de férias. Ela concorda e entramos na sua minúscula sala branca. Me sento na cadeira de canto e ela diz, empolgada, olhando para o exame que tenho em mãos:
"Ah, você trouxe o urodinâmico né?"
"Não. Trouxe a manometria anorretal, fora esse exame só tenho o de colonoscopia e o exame de trânsito colônico".
"Ué, você não tem incontinência urinária?..."
"Não. Tenho constipação crônica".
"Ai… acho que te marcaram errado. Eu só cuido de incontinência urinária, quem cuida do buraco de trás é outra fisioterapeuta".
Sorrisos amarelos se espalharam pela sala e eu lá pensando em como contar pro meu marido o que havia acontecido no consultório.
“Sabe o que é mozão… plano é assim: ruim com ele, pior sem ele”.
Agora estou de volta à fila de espera, aguardando o dia em que a “fisioterapeuta do buraco de trás” me ligar para agendarmos uma nova consulta.




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